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Qual será a nova cara do mundo pós-Covid-19?

Muitas são as reflexões sobre o momento que estamos vivenciando. Dois artigos, em especial, chamaram muito a atenção pelo pensar pós-pandemia. O primeiro, de Marcelo Furtado, sobre como fomentar uma nova economia voltada às pessoas e ao meio ambiente. O segundo, de Raquel Rolnik, sobre Pandemia e o futuro das cidades.

Marcelo Furtado é engenheiro químico, com mestrado em energias renováveis, e membro fundador e atuou de 2016 a 2018 como facilitador da Coalizão Brasil Clima, Floresta e Agricultura. Raquel Rolnik é arquiteta e urbanista, com doutorado em história, tendo desempenhado, dentre outras atividades, a função de relatora especial da ONU para o Direito à Moradia Adequada.

Todos estamos refletindo sobre o fato de que o mundo não é mais o mesmo que conhecemos até recentemente. O Covid-19 trouxe uma crise mundial, com impactos na saúde, na economia, nas políticas públicas e em nossas vidas.  Assim, temos que pensar o futuro. 

Além de medidas emergenciais, planejar a retomada quando ainda estamos na crise é muito importante, especialmente se quisermos evitar o desperdício de tempo e os erros incorridos nas crises econômicas passadas, fazendo um bom investimento no futuro de nossa sociedade.

Como afirma a historiadora e antropóloga Lilia Schwarcz, a sociedade já passou por diversas pandemias. No Brasil do final de 1918, ruas e bondes ficaram vazios, as escolas mandaram crianças para casa e os hospitais ficaram superlotados. Ela nos lembra que “toda crise interrompe muita coisa, mas abre, também, uma nesga de esperança. Por exemplo, foi por conta da Gripe Espanhola que se começou a pensar no Brasil, pela primeira vez, na criação de um Ministério da Saúde, que nasceria em 1930, como Ministério dos Negócios da Saúde e da Educação Pública”.

Hoje, imersos no intenso sofrimento de uma nova crise, da pandemia do Covid-19, que afeta profundamente indivíduos, famílias, comunidades, cidades e o planeta, temos uma notícia boa: estamos assistindo a uma queda acentuada na poluição atmosférica, a ponto de reduzir as emissões totais de carbono no mundo. A China reduziu a emissão de carbono na atmosfera em 25% e esse fenômeno também está ocorrendo em outros países que reduziram drasticamente suas atividades. Parte importante da queda na poluição está diretamente relacionada a poluentes que estão presentes nas emissões feitas pelos automóveis, caminhões e ônibus.

O Brasil é essencialmente um país urbano, com mais de 85% de sua população aglomerada nas cidades. Este foi um dos importantes fatores para a rápida contaminação comunitária do novo coronavírus. Precisamos, por exemplo, reestruturar as cidades e os sistemas de circulação não apenas promovendo aqueles que têm outra matriz energética, mas também fortalecendo as possibilidades de deslocamento a pé e modos não motorizados.

Além de contribuir para a redução das emissões totais de gases na atmosfera e, portanto, incidir no ritmo e intensidade das mudanças climáticas, a diminuição da poluição tem um grande impacto na saúde. Neste estudo com participação do professor Paulo Saldiva, da Faculdade de Medicina da USP, fica clara a relação direta entre tempo de exposição ao ambiente poluído e o surgimento de lesões pleurais (na membrana que reveste o pulmão). Se o coronavírus mata por debilitar o sistema respiratório, todos os dias os poluentes jogados na atmosfera também atacam exatamente os brônquios e pulmões de milhares de pessoas expostas a estas emissões, sacrificando vidas e sobrecarregando os sistemas de saúde.

 Um segundo impacto positivo da paralisação é a enorme redução de acidentes e mortes no trânsito. Claramente, isso já aparece nos pronto-socorros e nas UTIs de todo Brasil.

As consequências sociais e econômicas dessa pandemia serão devastadoras e isso explica o enorme volume de recursos sendo anunciado por vários países para o enfrentamento dessa batalha. O G-20 anunciou recentemente que injetará US$ 5 trilhões na economia global. Como garantir que esses recursos serão usados para atender os mais impactados e vulneráveis? Como aproveitar estes recursos para inovar e fomentar uma nova economia mais voltada para as pessoas e o ambiente?

É preciso evitar que os investimentos para a recuperação econômica se destinem à velha economia, a mesma que gerou atendimento precário à saúde, forte desigualdade, desmatamento e dependência de combustíveis fósseis, entre outras mazelas. Podemos transformar o legado desta terrível pandemia em um novo começo.

Neste momento, com muita tranquilidade e responsabilidade, devemos adaptar, rever estratégias e inovar conceitos. Em tempos de distanciamento social, como ato de solidariedade, fica muito óbvia a necessidade de liderança, sensatez, visão e empatia.

Ao ouvir a construção de um consenso entre economistas de que será necessário um plano de ativação econômica para recuperar o país, esperamos que a crise seja a oportunidade para mudanças positivas e superação de modelos que já se revelaram mais do que obsoletos.

 

Fontes:

https://pagina22.com.br/2020/04/04/como-fomentar-uma-nova-economia-voltada-as-pessoas-e-ao-meio-ambiente/?fbclid=IwAR2klDDVzgSEYv38086-Sn9RMZrxamatTotH-UFO9i8GOOuGy0B2Cg46As8

http://www.labcidade.fau.usp.br/pandemia-e-o-futuro-das-cidades/  

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